Noves meses passam rápido.
Talvez porque tudo passa. E somente por isso.
E depois que tudo passa, vira uma vírgula. Medos deixam de ser interrogações para servirem de exclamação: sinônimo de desafio.
Porque foram assim por 9 meses. Mas não sei dizer, se pra mim, passaram rápido, ou se ainda estão passando como um filme em câmera lenta.
Seria mais fácil dizer que passou rápido: verdade. Resposta rápida para quem vê de fora. De lá pra cá, o que era apenas um coração de bebê, transformou o meu coração em uma melancia do tamanho da minha barriga. Mas quando lembro de tudo o que passamos. Ai que tempo lento. Como se arrastou. Por isso, só respondo dizendo: passou.
Passou sem ter ninguém para soprar cada feridinha dizendo que vai ficar tudo bem. A gente sabe que virou adulto quando nós mesmos, em meio ao sofrimento, dizemos: "vai ficar tudo bem, marcela".
É essa mesma voz que nos faz escolher enfrentar cada dia e levantar a cada queda, enquanto teria sido muito mais confortável ficar na cama.
Muitas vezes escolhi: vou passar o resto dos 9 meses nessa cama, no escuro.
Ainda bem que mudei de idéia. Eu não teria conhecido pessoas maravilhosas, sempre dispostas a ajudar e te dar carinho e amor, de graça.
Eu não teria acordado feliz só por ver o sol, me sentindo a grávida mais bonita do mundo. A barriga me deu meses de beleza. Deu um estado de graça semelhante ao que Deus faz por nós: favor imerecido dos céus.
Eu provavelmente não teria comido morango com doce de leite com muito mais desejo. Do que adianta o amor se a gente não o abraça com todo o nosso coração? Bom dia sem beijo é café sem açúcar: tem quem goste.
Eu não teria sentido tanta raiva. Verdade. Mas também não teria aprendido a conviver com ela para assim, viver sem ela.
Eu não teria pensado no sentido do perdão por tantas vezes. Mesmo que tenha desistido dele por outras tantas.
Não teria pensado no amor como estado maior, necessário e vital, e a paixão como algo tão pequeno e passageiro. Tão passageiro como esse tempo que agora está indo embora. Intenso para tornar lento. Porém sempre rápido quando se acaba.
Eu também não teria encontrado força de onde não tinha mais. Força quando todo mundo tinha ido embora. Não teria aprendido a tomar decisões. E muito menos entendido que por mais que a ansiedade te faça pedir mil conselhos, não existe solidão maior do que tomar uma decisão.
Não tem como culpar ninguém por nossos erros. Mas o que podemos fazer é recomeçar sempre que reconhecemos um. O que já é um bom começo, afinal, conheço gente que passou dos 60 e ainda não reconhece erros.
Bom, talvez eu não tivesse me deparado tantas vezes com o pior de mim. Mas o que é a vida sem essa oportunidade de amadurecer? Como posso construir quem sou, sem sozinho por completo, se não me conhecer, a ponto de reconhecer o meu pior?
Eu também não teria aprendido a ser completamente independente. E mais uma vez, aqui, coloco uma exclamação: desafio. Não existe maturidade se dependermos de alguém. É um confronto que dói, mas nos torna maiores do que achamos que podemos ser.
Eu não teria sentido tanto medo. Não teria confundido o medo do escuro com o medo da responsabilidade de ser mãe. Não teria me reconhecido tão egoísta por ter medo de abdicar da minha própria solidão, do "faço o que quero", para agora, cuidar de um ser tão pequeno e dependente de mim.
Cheguei até pensar muitas vezes que sentia saudade de quem eu era. De inventar paixões para ter um sentido de vida. De acordar com o coração acelerado por bobagem. Ou saber que amanhã aquilo iria viria uma desilusão, pequena, mas que em vez de me acrescentar alma, ia me tornar ainda mais vazia.
Porque também aprendi a não sentir mais vazia. Medo, normal: o que seria a coragem sem medo? Mas sentido mesmo de vida é aprender a crescer com as dores. Aprender a amar com as dores.
É passar uma noite chorando com medo do futuro e quando colocar os pés nesse mesmo futuro pensar: "foi mais fácil do que eu imaginava".
Não foi mais fácil do que eu imaginava. Foi infinitamente mais duro e doloroso do que eu pensava que poderia agüentar. A diferença é que agüentei de forma mais fácil, mais sutil. Que me tornei muito maior que isso.
E sim, acabou sendo mais fácil. E por isso, o tempo acabou passando um pouco rápido, relativamente.
Ontem era uma sementinha que precisava ser regada. Talvez com lágrimas. Hoje, uma árvore que ninguém é capaz de derrubar. Por mais brega que isso pareça, é para ser brega mesmo.
Porque seria impossível escrever uma carta de 9 meses de gravidez sem ser brega. Gravidez é amor. É amor que vai-se gerando aos poucos. E o amor pra mim é brega.
Ele vai crescendo, ganhando vida. Notou que é a gestação pode ser a metáfora mais bonita para o amor?
Ou você ainda acha que se ama como um insight e só se tem segurança no amor naquilo que se conhece profundamente? ou mesmo que para amar, afinidades se bastam?
não!
Se eu tivesse escolhido não me levantar da cama e ver o sol para a amar a lua, não teria entendido que a gravidez é a principal metáfora para o amor.
Começa aos poucos. Assusta. Não sabemos quem somos mais. Vai crescendo. Intenso. Muito intenso. Dói. Magoa. Mas vamos aprendendo a admistrar essa overdorse de sentimentos malucos, contraditórios. E como aprendemos. Vamos crescendo por dentro e por fora.
Vamos aprendendo a apreciar. Enxergamos o lado bom e ficamos mais leve apesar do "peso" e responsabilidade que tudo isso implica. As vezes queremos chorar. Mas na maioria queremos sorrir com gigantes panelas de brigadeiros.
Tudo ganha mais sentido, mais vida e mais cor. E mesmo que a vida seja difícil, é impossível desistir: há um sentido maior. Passamos da fase da paixão. Crescemos muito mais que isso.
E depois? vida. o milagre da vida.
=)
Foram 9 meses difíceis. Mas hoje posso dizer que minha vida não poderia ter mais sentido sem tudo o que aprendi. O amor cresceu com a minha própria força. Já não preciso inventar paixões e sentidos de vida.
Com isso termino essa carta, dizendo:
Pode vir, meu filho, meu Tiago, meu pequeno grande amor. Mamãe está preparada para receber você.
No dia 30 de julho de 2011, eu nunca imaginaria que um dia escreveria isso. É por isso que dizem: devemos viver um dia de cada vez.
E amar em todos eles.
Marcela, 38 semanas de Tiaguinho. A sementinha que virou amor.
2 comentários:
Lindo! Lindo!
Vou "roubar" esse aprendizado para mim: "Ele vai crescendo, ganhando vida. Notou que é a gestação pode ser a metáfora mais bonita para o amor?"
Parabéns, o Tiago soube escolher muito bem a mãe e o momento!
Beijos e boa hora para você, que ele te ensine ainda mais!
Que a felicidade continue te seguindo, linda, em cada canto. Vocês merecem cada estrela do céu, à noite, e cada raio de sol da manhã. Sou fã da Marcela, mãe, guerreira, iluminada.
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