sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Epitáfio

Maximiliano Alves Motta tinha 39 anos e poucos ideais.
Apegou-se à rotina. Na sua idade, sem filhos e com um emprego medíocre, era a única coisa que podia gerar algum tipo de afeição à vida.
Sentia prazer em acordar cedo, olhar as plantas e mais ainda em ler o seu jornal tomando o café sem açúcar.
Tinha uma teoria. Homem que é homem toma café puro. Esse sim merece respeito.
E falando em respeito, o bigode estava lá confirmando toda a sua autarquia.

Mas foi numa dessas manhãs rotineiras, que abriu o jornal e deparou-se com a fatídica notícia: seu próprio obituário. Deu tontura, agonia e até asma.

Não era possível. Mas era exatamente a sua foto: camisa florida e alegria estampada, enquanto curtia um antigo carnaval de Salvador. Uma época em que até amor chegou a sentir por Sandrinha: aquela baiana arretada, alegre e de grandes peitos.

Chegou a pensar que devia estar morto. Tinha acordado no além, só pode. Mas como não viu nem sinal do capeta, nem muito menos de Deus, logo percebeu que não tinha morrido.

Fato era que bebeu tanto que dormiu pensando: qualquer dia eu bebo até morrer. Meu jesus, me abençoa, prometo que foi a última vez.


Mas não foi pra tanto.
Talvez fosse alguma peça do destino. O jornal ta tão moderno que tava adivinhando até seu futuro.
E dessa vez, era possível.
Virou a página no jornal e tinha lá:
25 de Março de 2018.
Faltavam dois meses para sua morte.
E agora? O que ia fazer para aproveitar o tempo que restava?
Quantos cafés de macho ainda despertariam Maximiliano em todas as manhãs?
Na situação de solidão dele, provavelmente, só a rotina iria a seu enterro.
O que por ele, já era alegria demais.

Vestiria a rotina com um vestido rendado branco e dormiria com ela no cemitério mais bonito da cidade. Cemitério onde o coveiro ia gostar de passar todo dia às 6h da manhã, limpar as flores e ler o jornal. Necessariamente nesta ordem.

Mas não era bem assim. Em seu obituário dizia:
"Maximiliano Alves. 39 anos. Homem de bem. Homem que descobriu o amor no fim da sua vida. Homem que lutou até o fim. Corajoso, único."
De sua eterna amada, Sandrinha.

Por um instante, Maximiliano suou. Como possível? Sandrinha, aqueles belos peitos. Aquele sorriso contagiante que ele deixara em pleno carnaval, com olhos de saudade…
Era ela, o seu amor.
Era ela que o faria trocar a rotina. Era ela!!
Por um instante, amou. Sentiu calafrio, sentiu a alma sorrindo.

Até que a campainha tocou.
“é hoje”.
Abriu a porta e levou um tiro. No coração. Logo o coração que acabara de ser flechado.
Já era. Morreu na hora.
Dizia a lenda da cidade: homem que ama só uma vez na vida, morre num tiro só.
Sandrinha correu.

E esquecido e abandonado como era o Maximiliano, azar.

Só descobriram sua morte 2 meses depois.

O obituário saiu atrasado.

E Sandrinha, como a viúva romântica do obituário que fez a população inteira chorar, saiu por inocente.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Porquinho

Abel era um porco-cofrinho gordo. Só colecionava moedas de chocolate.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Luneta

Tinha um brilho diferente nos olhos de Carola.
Ela chegou a supor que poderia ser a lua.

A lua tem dessas coisas. Vez por outra, tem mais estrelas a seu redor do que o normal.

E isso não poderia ser à toa.

Porque foi exatamente nessa época que olhar de Carola tinha mais estrelas ao redor.

Coisa de menina romântica que ainda faz da lua, um filme na noite de sábado. Olhar a lua faz bem à alma, já dizia a menina.
E amar faz bem aos olhos. Como assim?

Começou a dizer que o amor é cego desde que foi ofuscada por um brilho intenso. E esse brilho, nem as estrelas podia roubar.

Nem as estrelas podiam roubar o tal menino de Carola.

O céu, talvez, tenha alguma permissão.

Mas só porque era lá que ela vivia desde que foi ofuscada. O amor não é cego. O amor cega.

E sem ver ela poderia sentir. ( talvez nesse momento, a lua tenha se escondido por trás das nuvens)

Muito mais. E de verdade.